Saúde e território
em contexto de pós-pandemia

A realização em Lisboa, nos dias 12 a 14 de setembro de 2022, no Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa, do Congresso Geosaúde 2022, subordinado ao tema “Desigualdades em saúde, desigualdades no território: desafios para os países de língua portuguesa em contexto de pós-pandemia”, criou a oportunidade de reunir académicos e profissionais de várias áreas relacionadas com a saúde.

Organizado em oito eixos, o Geosaúde 2022, decorreu num momento em que a Geografia viu reforçada a sua importância na explicação dos fenómenos. A capacidade interpretativa, tendo por base fatores relacionados com a estrutura demográfica, com o sistema de povoamento, nomeadamente o papel das cidades, a distribuição das atividades económicas, a mobilidade e a conjugação de fatores biológicos e de estado de saúde das populações, explicaram, não só os diferenciados padrões de difusão do SARS-CoV-2 (Andersen et al., 2020; Fortaleza et al., 2020; Nossa et al., 2022; Mileu et al., 2022; Oliveira et al., 2022; Praharaj et al., 2020; Sousa et al., 2021), como demonstraram as implicações da pandemia COVID 19 no aumento das desigualdades ao nível económico, social e ambiental, das escalas global à local (European Committee of the Regions et al., 2020; Korte et al., 2021; Mofijur et al., 2021). O planeamento urbano assente na sustentabilidade, vê reforçado a sua importância, valorizando-se os espaços verdes, a mobilidade suave e a caminhabilidade, novas formas de organização e de localização do trabalho, a preservação dos ecossistemas, a reorganização dos sistemas de saúde, entre outros aspetos. Mostrou ainda a necessidade de desenvolver sistemas de monitorização e novas abordagens de análise do território que deem suporte à decisão.

A presente secção contém cinco textos que abordam alguns destes temas.

Os primeiros três textos evidenciam a importância de desenvolver sistemas de monitorização com base em informação, abrangendo domínios diretamente relacionados com a saúde bem como outros complementares, como suporte à decisão. O trabalho de Rodriguez-Rodriguez e Alonso Pardo (2022), apresenta uma metodologia que elenca informação sobre o sistema de saúde e outros indicadores sociais complementares, fundamentais para o planeamento e ordenamento da saúde na Mauritânia, país com um vasto percentual de população vulnerável. A elaboração do mapa sanitário permite adequar a oferta de serviços às necessidades da população e deu suporte à implementação de Planos de Desenvolvimento da Saúde cujo objetivo era combater as desigualdades em termos de saúde. O segundo texto, de Vieira et al. (2022) centra-se na importância da monitorização da qualidade da água através do controlo dos usos de solo nos territórios que integram a bacia hidrográfica do Rio Itajaí-Mirim (Brasil), como suporte às políticas públicas. O artigo de Gioia et al. (2022) procura identificar o papel dos fatores socioeconómicos na previsão do risco de contágio de doenças negligenciadas como a hanseníase, leishmaniose tegumentar e dengue. A metodologia desenvolvida seleciona as variáveis socioeconómicas mais importantes ajudando a adequar respostas de política.

O segundo grupo de artigos aborda diferentes perspetivas relacionadas com a qualidade de vida das populações e sua relação com o meio urbano. Assim, o quarto texto apresentado por Veloso et al. (2022) traz para a discussão um tema em crescente afirmação durante a pandemia COVID-19. O estudo realizado na Área Metropolitana de Lisboa Norte desenvolve uma reflexão sobre o teletrabalho, discutindo os seus efeitos nas famílias. Os resultados mostram que apesar da redução do tempo gasto em mobilidade, existe uma maior dificuldade na gestão de tempo, afetando o equilíbrio trabalho-família. Numa ótica diferente, Santana et al. (2022) apresentam um estudo que realça o papel da Vitamina D para a saúde das populações, relacionando a sua disponibilidade com o clima local e com a presença de áreas verdes como espaços de prevenção e promoção de saúde. O estudo foca-se na população feminina de Araraquara – São Paulo (Brasil) e vem demonstrar como o reforço do planeamento urbano, assente em Nature-Based Solutions, contribui para diminuir a poluição e para melhorar a saúde pública.

A diversidade temática e geográfica presente nos cinco artigos é representativa da qualidade do Geosaúde 2022, cujos resultados podem ser consultados em Marques da Costa e Louro (2022). Importa realçar ainda que o texto de Thamy Bárbara Gioia et al., (2022) estudante do Programa de Doutorado em Geografia da Universidade Federal de Goiás, intitulado “Fatores socioeconómicos e algoritmos de Machine Learning aplicados à predição de risco de doenças negligenciadas. Estudo de caso nos municípios do Estado de Goiás e Distrito Federal, Brasil” recebeu o Prémio de Investigador e o texto de Patricia Veloso et al., (2022) estudante do Mestrado em SIGOT do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa e Bolseira de Projeto FCT, com o texto intitulado “Teletrabalho em tempo de pandemia: das vantagens às incertezas nos quotidianos das famílias residentes na Área Metropolitana de Lisboa Norte, Portugal”, recebeu o Prémio de Jovem Investigadora, atribuídos pela União Geográfica Internacional – Comissão de Saúde e Ambiente.

Deixamos aqui o convite a desfrutarem destas leituras.

Eduarda Marques da Costa

Paulo Nossa

Raul Borges de Guimarães

ORCID iD

Eduarda Marques da Costa https://orcid.org/0000-0001-5070-3562

Paulo Nossa https://orcid.org/0000-0001-5000-8754

Raul Borges de Guimarães https://orcid.org/0000-0002-9925-5374

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Andersen, L. M., Harden, S. R, Sugg, M. M., Runkle, J. D. D., & Lundquist, T. E. (2020). Analyzing the spatial determinants of local COVID-19 transmission in the United States. Science of The Total Environment, 754, 142396. https://doi.org/10.1016/j.scitotenv.2020.142396

Bem-Haja, P., Cravidao, F., Freia, A., Masquete, J., Mota-Pinto, A. & Nossa, P. (2022). Spatial Diffusion of COVID-19: From Hyper-Connected Territories to Marginal Areas – The Case of Niassa, Mozambique. In: Fuerst-Bjeliš, B., Nel, E., Pelc, S. (Eds), COVID-19 and Marginalisation of People and Places. Perspectives on Geographical Marginality, 7. Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-031-11139-6_14

European Committee of the Regions, Böhme, K., Besana, F., & Lüer, C. (2020). Potential impacts of COVID-19 on regions and cities of the EU. European Committee of the Regions. https://data.europa.eu/doi/10.2863/56992

Fortaleza, C. M. C. B., Guimarães, R. B., de Almeida, G. B., Pronunciate, M., & Ferreira, C. P. (2020). Taking the inner route: spatial and demographic factors affecting vulnerability to COVID-19 among 604 cities from inner São Paulo State, Brazil. Epidemiology and Infection, 148, e118. http://doi.org/10.1017/S095026882000134X

Gioia, T. B., Barros, J. R., & Silva, R. R. (2022). Fatores socioeconómicos e algoritmos de Machine Learning aplicados à predição de risco de doenças negligenciadas. Estudo de caso nos municípios do Estado de Goiás e Distrito Federal, Brasil [Socioeconomic factors and machine learning algorithms applied to neglected diseases risk prediction. Case study in the municipalities of the Goiás state and Federal District, Brazil]. Finisterra – Revista Portuguesa de Geografia, LVII(121), 109-123. http://doi.org/10.18055/Finis28635

Korte, J., Kauffmann, B., & Stemitsiotis, L. (Coords.)(2021). Employment and Social Developments in Europe (ESDE) report 2021. Publications Office of the European Union, Directorate-General of Employment, Social Affairs and Inclusion. http://doi.org/10.2767/049867

Marques da Costa, E., & Louro, A. (2022). Desigualdades em saúde, desigualdades no território: desafios para os países de língua portuguesa em contexto de pós pandemia [Health inequalities, inequalities in the territory: challenges for Portuguese-speaking countries in context post-pandemic]. Centro de Estudos Geográficos. http://doi.org/10.33787/CEG20220006

Nossa, P., Mota-Pinto, A., Freia, A., Masquete, J., Bem-Haja, P., & Cravidão, F. (2022). Spatial Diffusion of COVID-19: From Hyper-Connected Territories to Marginal Areas – The Case of Niassa, Mozambique. In: Fuerst-Bjeliš, B., Nel, E., Pelc, S. (Eds), COVID­-19 and Marginalisation of People and Places. Perspectives on Geographical Marginality, 7. Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-031-11139-6_14

Mileu, N., Costa, N. M., Costa, E. M., & Alves, A. (2022). Mobility and Dissemination of COVID-19 in Portugal: Correlations and Estimates from Google’s Mobility Data. Data, 7(8), 107. https://doi.org/10.3390/data7080107

Mofijur, M., Rizwanul Fattah, I. M., Alam, M. A., Islam, A. B. M. S., Ong, H. C., Rahman, S. M. A., & Mahlia, T. M. I. (2021). Impact of COVID-19 on the social, economic, environmental and energy domains: Lessons learnt from a global pandemic. Sustainable Production and Consumption, 26, 343-359. https://doi.org/10.1016/j.spc.2020.10.016

Oliveira, S., Ribeiro, A. I., Nogueira, P., & Rocha, J. (2022). Simulating the effects of mobility restrictions in the spread of SARS-CoV-2 in metropolitan areas in Portugal. PLoS ONE, 17(9), e0274286. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0274286

Praharaj, S., King, D., Pettit, C., & Wentz, E. (2020) Using Aggregated Mobility Data to Measure the Effect of COVID-19 Policies on Mobility Changes in Sydney. Phoenix and Pune, Findings. https://doi.org/10.32866/001c.17590

Rodriguez-Rodriguez, M. de los A., & Alonso Pardo, S. (2022). El Mapa Sanitario, una herramienta para la planificación y ordenacionación en salud: el caso de Mauritania [The Sanitary Map, a tool for health planning and management: the case of Mauri­tania]. Finisterra – Revista Portuguesa de Geo­grafia, LVII(121), 71-93. http://doi.org/10.18055/Finis28655

Santana, K., Olivier, S.& Ribeiro, H. (2022). Áreas Verdes e Status de Vitamina D. Análise com mulheres residentes de uma cidade média e de clima tropical [Green Areas and Vitamin D Status. Analysis with women residents of an average city and climate tropical]. Finisterra – Revista Portuguesa de Geografia, LVII(121), 151-170. http://doi.org/10.18055/Finis28605

Sousa, P., Marques da Costa, N., Marques da Costa, E., Rocha, J., Peixoto, V. R., Fernandes, A. C., Gaspar, R., Duarte-Ramos, F., Abrantes, P., & Leite, A. (2021) COMPRIME – COnhecer Mais PaRa Intervir MElhor: Preliminary Mapping of Municipal Level Determinants of COVID-19 Transmission In Portugal at Different Moments of the 1st Epidemic Wave. Portuguese Journal of Public Health, 38, 18-25. https://doi.org/10.1159/000514334

Veloso, P., Marques da Costa, E., & Abrantes, P. (2022). Teletrabalho em tempo de pandemia: das vantagens às incertezas nos quotidianos das famílias residentes na Área Metropolitana de Lisboa Norte, Portugal [Teleworking in pandemic time: the advantages the uncertainties in the daily lives of families residents in the Lisbon Metropolitan Area Norte, Portugal]. Finisterra – Revista Portuguesa de Geografia, LVII(121), 125-150. https://doi.org/10.18055/Finis28818

Vieira, I. C. B., Correa da Costa, V. S., Cionek, V. de M., Branco, J. O., & Werneck Ribeiro, E. A. (2022). Predileção de Riachos para o Monitoramento da Qualidade da Água: um serviço ecossistêmico de provisão na bacia hidrográfica do Rio Itajaí-Mirim (Brasil) [Predilection of Streams for the Monitoring of Water Quality: an ecosystem service of provision in the Itajaí-í river basin-Mirim (Brazil)]. Finisterra – Revista Portuguesa de Geografia, LVII(121), 95-108. https://doi.org/10.18055/Finis28482