"Estão a apanhar casas!". Ocupação do 2 de Maio no fervor da Revolução Portuguesa

Autores

  • Saila-Maria Saaristo Universidade de Helsínquia https://orcid.org/0000-0002-6535-8586
  • Joana Pestana Lages Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Centro de Estudos sobre a Mudança Socioeconómica e o Território
  • Miguel Tomé Independent researcher

Palavras-chave:

ocupações habitacionais, movimentos habitacionais, Revolução do 25 de Abril, Portugal

Resumo

Este artigo explora o movimento de ocupação que teve lugar durante o chamado Processo Revolucionário em Curso (PREC), de 1974 a 1976. Centramo-nos no caso específico do bairro 2 de maio, em Lisboa, onde 25 blocos de habitação em construção foram ocupados em maio de 1974. Relacionamos estas ocupações com as ocupações de habitações sociais em Lisboa na atualidade, cruzando as suas características e o contexto sociopolítico em que ocorrem. Metodologicamente, o artigo baseia-se nas conceções de trabalho de memória radical e de investigação-ação participativa de base comunitária. A análise revela que os traços específicos do movimento de ocupação do PREC, impulsionado pela precariedade habitacional e promovido coletivamente pelos moradores das classes socioeconómicas mais desfavorecidas, desempenharam um papel vital na forma como perduraram ao longo do tempo. Contudo, em particular, a resposta dos atores estatais, influenciada pelo contexto político específico do PREC, bem como o amplo apoio recebido por outros atores, foi fundamental para permitir a sua permanência e posterior regularização. Este artigo contribui para os debates sobre o potencial das ocupações para promover o acesso à habitação, destacando os papéis que os atores estatais e o ambiente político desempenham em termos de legitimação das ocupações.

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Publicado

2024-11-29