Concentrado de Fibrinogénio na Hemorragia Obstétrica
DOI:
https://doi.org/10.25751/rspa.15976Palavras-chave:
Complicações Hematológicas na Gravidez; Fibrinogénio; Hemorragia Pós-Parto; Perturbações da Coagulação SanguíneaResumo
O fibrinogénio é uma glicoproteína plasmática solúvel. É sintetizado nos hepatócitos e armazenado nas plaquetas, tem uma concentração plasmática entre 2-4,5 g/L, sendo mais alta na gravidez, e uma semivida de 4-7 dias. Funciona como um reagente de fase aguda e é determinante para uma hemóstase eficaz. Na hipofibrinogenemia, congénita ou adquirida, existem três fontes possíveis para a reposição de fibrinogénio: plasma fresco congelado, crioprecipitado e concentrado de fibrinogénio.
O concentrado de fibrinogénio tem sido utilizado para o controlo da coagulopatia, contribuindo para a menor utilização de produtos sanguíneos alogénicos na hemorragia major em vários contextos clínicos. A sua administração é uma intervenção hemostática importante e eficaz, sendo considerado um "agente hemostático universal potencial".
Durante a gravidez são observadas marcadas alterações na hemóstase. Estas alterações hemostáticas de hipercoagulabilidade são uma preparação fisiológica para as perdas sanguíneas do parto, contudo também propiciam eventos tromboembólicos.
A hemorragia obstétrica é a principal causa de morbimortalidade materna, mesmo em países desenvolvidos, sendo, ainda, a causa mais evitável de mortalidade. A hemorragia pós-parto é a sua forma mais frequente. A hemorragia massiva em obstetrícia é um evento crítico que exige uma abordagem interdisciplinar assertiva. A implementação de protocolos de gestão da hemorragia obstétrica, com algoritmos transfusionais, tem conduzido à redução da morbilidade, devendo existir em todas as Unidades Obstétricas. Os vários protocolos diferem na estratégia de ressuscitação hemostática.
A diminuição dos níveis plasmáticos de fibrinogénio parece ser um biomarcador na previsão do agravamento da hemorragia pós-parto, pelo que a administração de concentrado de fibrinogénio é uma intervenção hemostática fundamental. Ainda não existe consenso em relação aos trigger e alvo plasmáticos para reposição de fibrinogénio. As Recomendações Portuguesas da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia de 2018 consideram hipofibrinogenemia na hemorragia pós-parto quando: 1) fibrinogénio ≤2,9 g/L; 2) FIBTEM
maximum clot firmness ≤18 mm; 3) perdas sanguíneas ≥1,5 L com hemorragia contínua e resultados laboratoriais ainda não disponíveis. A dose inicial recomendada é 25-50 mg/kg, podendo ser necessárias
doses adicionais em função da evolução clínica e/ou monitorização laboratorial.
A utilização crescente de concentrado de fibrinogénio, associada aos métodos de avaliação da competência hemostática point-ofcare modificou de forma significativa a estratégia terapêutica na hemorragia obstétrica. A correção precoce e dirigida da coagulopatia está associada a redução de componentes sanguíneos transfundidos e das complicações relacionadas. Apesar do papel inquestionável do concentrado de fibrinogénio, algumas questões estão, ainda, por definir para que exista maior precisão na terapêutica da hemorragia obstétrica.
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