Como ser um bom aluno? Dos modelos de escola aos pontos de vista das crianças

Autores

  • Benedita Melo Universidade de Lisboa

DOI:

https://doi.org/10.21814/rpe.21531

Palavras-chave:

Performatividade, Excelência escolar, Bom aluno, Perspetivas das crianças, 1.º Ciclo

Resumo

Resumo 

A apologia da performatividade e da excelência, resultante dos novos modos de regulação dos sistemas educativos, parece estar a penetrar em todos os níveis de escolaridade. Centrado na análise do ofício de aluno do 1.º ciclo, e tendo por base a hipótese de que estará em curso uma reconfiguração do modelo da escola primária assente na performatividade-competitividade, este texto analisa as perspetivas que crianças, oriundas de contextos geográficos, escolares e socioeconómicos distintos, possuem sobre o que é ser um bom aluno. A pesquisa teve por base a análise de conteúdo de entrevistas semidiretivas realizadas a 61 crianças do 3.º ano de escolaridade, em 2017/18. Os pontos de vista das crianças evidenciam duas dimensões essenciais das práticas escolares: a dimensão do poder e a dimensão cognitiva. As suas referências à ordem escolar deixam perceber como a estrutura do modelo de escola tradicional-industrial subsiste na atualidade. No entanto, é a componente das aprendizagens a que é mais valorizada nos seus discursos. As condições por elas enunciadas para participarem nos processos de aprendizagem dão conta de dois tipos de conceções sobre a excelência escolar. Uma primeira que enaltece os dons individuais, nomeadamente a inteligência, presente sobretudo entre as crianças com uma proveniência social menos escolarizada e menor desempenho escolar. Uma segunda conceção, próxima do modelo escolar performativo-competitivo, surge ancorada no trabalho, esforço, dedicação e superação individual, e está sobretudo presente nas crianças oriundas de famílias mais escolarizadas, com muito bom aproveitamento escolar.

A pesquisa teve por base a análise de conteúdo de entrevistas semi-diretivas, realizadas a 61 crianças do 3º ano de escolaridade, em 2017/18.

Os pontos de vista das crianças evidenciam duas dimensões essenciais das práticas escolares, a dimensão do poder e a dimensão cognitiva. As suas referências à ordem escolar deixam perceber como a estrutura do modelo de escola tradicional-industrial subsiste na actualidade. No entanto, é a componente das aprendizagens a que é mais valorizada nos seus discursos. As condições por elas enunciadas para participarem nos processos de aprendizagem dão conta de dois tipos de concepções sobre a excelência escolar. Uma primeira que enaltece os dons individuais, nomeadamente a inteligência, presente sobretudo entre as crianças com uma proveniência social menos escolarizada e menor desempenho escolar. Uma segunda conceção, próxima do modelo escolar performativo-competitivo, surge ancorada no trabalho, esforço, dedicação e superação individual, e está sobretudo presente nas crianças oriundas de famílias mais escolarizadas, com muito bom aproveitamento escolar.

Palavras-chave: Performatividade - Excelência escolar - Bom aluno - Perspetivas das crianças - 1º Ciclo 

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Benedita Melo, Universidade de Lisboa

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Publicado

2022-12-30

Como Citar

Melo, B. (2022). Como ser um bom aluno? Dos modelos de escola aos pontos de vista das crianças . Revista Portuguesa De Educação, 35(2), 125–147. https://doi.org/10.21814/rpe.21531

Edição

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Artigos