Consciência e esclarecimento no Boletim de Eugenia (1929-1933): Repensando o conceito de educação eugênica no Brasil
DOI:
https://doi.org/10.21814/rpe.24742Palavras-chave:
Eugenia, Boletim de Eugenia, Eugenia no Brasil, Educação eugênica, Teoria críticaResumo
O presente artigo analisa o conceito de educação eugênica no Boletim de Eugenia (1929-1933), o maior periódico especializado na ciência do melhoramento racial e principal meio de disseminação do racismo científico no Brasil. Editado no Rio de Janeiro pelo médico e farmacêutico Renato Ferraz Kehl entre 1929 e 1931, sua direção foi assumida a partir de 1932 pelos professores da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ) Octavio Domingues e Salvador de Toledo Piza Júnior. Além de alterarem as características do periódico, perdendo o aspecto de jornal de propaganda e assumindo o formato de revista científica, os dois renomados geneticistas de Piracicaba respaldaram cientificamente a eugenia mendeliana de Kehl, garantindo a continuidade e a radicalização de seu projeto. Tomando como aporte teórico-metodológico uma pesquisa documental em diálogo com a Teoria Crítica, investigamos a mobilização e a inter-relação entre os conceitos de consciência e esclarecimento nos artigos publicados no Boletim de Eugenia. Constatamos que o conceito de educação eugênica se apresentou de forma ambígua e contraditória nesses textos, refletindo o sentido amplo no qual o termo foi estruturado por Francis Galton, mas também a maneira particular como as noções de esclarecimento e consciência eugênica foram interpretadas pelos diretores do periódico. Concluímos que o termo educação eugênica, empregado de forma generalizante na historiografia da eugenia, é insuficiente para uma compreensão crítica dos sentidos restrito e amplo da educação desenvolvidos desde Galton até aos membros mais radicais do movimento eugenista brasileiro.
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